O legado dos exames post-mortem para o estudo da relação entre forma clínica e substrato patológico na esclerose múltipla. Uma revisão sobre a anatomopatologia da doença
The legacy of post-mortem examination for the study of the relation between the clinical form and the pathological substrate in multiple sclerosis. A review on the anatomopathology of the disease
Rev. bras. neurol; 48 (4), 2012
Publication year: 2012
Após a dissecção de cérebro de uma paciente em 1868, Charcot definiu uma evidência histopatológica mais assertiva para a esclerose múltipla (EM): "sclerose en plaque". Entretanto, mais de um século depois, poucos estudos examinando o substrato patológico específico de fenótipos clínicos diferentes da EM são encontrados na literatura. O objetivo deste estudo é uma revisão da literatura sobre achados post-mortem (autopsia, exame histopatológico e técnicas imuno-histoquímicas) em pacientes com EM. Utilizando os termos "autopsy", "necropsy", "pathology", "post-mortem" e "multiple sclerosis", a pesquisa foi desenvolvida sobre a literatura e recursos presentes no MEDLINE no período janeiro 1990 a agosto 2012. Artigos relevantes baseados em análise macro/microscópica das lesões da EM e o uso de técnicas imuno-histoquímicas (marcadores imunológicos e neurobiológicos) foram revistos. Tratados de patologia cirúrgica e neuropatologia em suas últimas edições foram também consultados. Além dos estudos no início dos anos 2000 que identificaram padrões diferentes de desmielinização em casos de autópsia, considerando a perda de mielina, a geografia e extensão das lesões, a destruição dos oligodendrócitos e a evidência do dano imunopatológico, estudos mais detalhados e baseados em aspectos anatomopatológicos e implicações patogênicas são raros. A maioria destes poucos e específicos estudos reportam que as lesões da EM tipicamente aparecem na substância branca, mas são também abundantes na substância cinza, heterogeneidade de lesões inter-paciente e homogeneidade intra-paciente, graus diferentes para perda de mielina e estágios de atividade, foco de atividade inflamatória que origina gliose fibrilar, distrofia de oligodendrócitos e densidade axonal central diminuída. Desmielinização é um importante indicador de progressão clínica e a remielinização pode ser incompleta ou decresce com a cronicidade da doença. A importância das lesões na substância branca de aparência normal e na substância cinzenta tem sido cada vez mais reconhecida em recentes estudos com técnicas imuno-histoquímicas. Não há ainda um consenso se as diferenças entre as formas clínicas são fundamentalmente quantitativas ou qualitativas em relação ao substrato patológico e mais estudos sobre autopsias utilizando exame histopatológico e técnicas modernas de imuno-histoquímica são necessários para dirimir esta questão. Um melhor entendimento sobre a heterogeneidade das lesões da esclerose múltipla proporcionará o desenvolvimento de métodos terapêuticos mais direcionados e eficazes.
After dissection of a female brain in 1868, Charcot outlined a more assertive histopathological evidence of Multiple Sclerosis: "sclerose en plaque". However, more than a century later, very few studies examining the specific underlying pathology of a defined MS clinical phenotype are found in literature. The purpose of this study is to provide a literature review of post-mortem findings (histopathology and immunohistochemical techniques) in MS patients. The literature in MEDLINE was searched from January 1990 to August 2012 using the terms "autopsy", "necropsy", "pathology", "postmortem" and "multiple sclerosis". Relevant papers based on macroscopic/microscopic analysis of the MS lesions and the use of broad spectrum of immunological and neurobiological markers (immunohistochemistry) were reviewed. Textbooks of Surgical Pathology and Neuropathology in latest editions were also consulted.Besides the studies in the early 2000s that identified different patterns of demyelination in autopsy cases, consider the myelin impairment, the geography and extension of lesions, the oligodendrocyte destruction and the evidence of immunopathological damage, more detailed studies based on anatomopathological aspects and pathogenic implications are rare. Most of these few specific studies reported that MS lesions typically appear in the white matter, but are also abundant in grey matter, inter-patient lesions heterogeneity with intra-patient homogeneity, different degree of myelin loss and stage of activity, focus of inflammatory activity that gives way to fibrillary gliosis, oligodendrocyte dystrophy and decreased central axonal density. Demyelination is an important pathological correlate of clinical progression and remyelination could be incomplete or decreases with disease chronicity. The importance of healthy-appearing white matter damage and grey matter demyelination has been increasingly recognized in recent studies using immunohistochemical techniques. There is still no consensus on whether the differences between the clinical forms of MS are fundamentally quantitative or qualitative in relation to the pathological substrate, and more detailed studies with data on autopsies is required to resolve this issue. A better understanding of the pathogenetic heterogeneity of MS lesions will lead the development of more effective treatment methods.