Saúde debate; (32), 1991
Publication year: 1991
Com o título:
"Tese de que AIDS é um tipo de sífilis revoluciona conceitos", a Folha de Säo Paulo colocou ao público leitor discussöes polêmicas que vêm sendo travadas em fóruns médico-científicos a partir do pressuposto de que a síndrome da imunodeficiência adquirida poderia ser uma nova manifestaçäo da sífilis. Este artigo näo pretende transitar por esses embates, mas refletir sobre idéias presentes no discurso médico sobre a sífilis no Brasil dos anos 20, procurando apontar para algumas práticas médico-discursivas que permeiam a AIDS, em nossos dias, principalmente no que se refere à inserçäo de ambas no rol das doenças sexualmente transmissíveis. Em uma sociedade, como a brasileira, que näo sabe lidar com as diferenças sexuais, as doenças transmitidas sexualmente possibilitariam os "discursos sobre o sexo", provocando o que Foucault denominava "erotismo discursivo generalizado". As práticas médicas tratariam de preservar, recomendar condutas sexuais, criando formas de intervençäo, de gerência sobre o sexo, sob o manto "purificado e neutro da ciência". Entre o indivíduo e seu sexo, colocar-se-ia o Estado com as campanhas intervencionistas, buscando estabelecer o comportamento geral das pessoas. Essa intervençäo variaria em funçäo das necessidades econômicas e políticas da época, mas realizar-se-ia nos limites entre o biológico e o político (Foucault, 1985, p.29). A medicina definiria, portanto, a normalidade e a patologia das condutas sexuais - a "verdade" sobre o sexo - subordinado aos imperativos de uma moral, cujas classificaçöes reiterou, sob forma de normas médicas (Foucault, 1985, p.54)