Quando a ressonância magnética importa para a avaliação das cardiopatias
When Magnetic resonance imaging matters for the evaluation of cardiopathies

Rev. Soc. Cardiol. Estado de Säo Paulo; 27 (2), 2017
Publication year: 2017

A ressonância magnética cardíaca (RMC) é uma modalidade de imagem não invasiva capaz de fornecer informações precisas e, muitas vezes, únicas na investigação de cardiopatias em geral e, em especial, nas cardiomiopatias. A capacidade de caracterizar precisamente o miocárdio do ponto de vista de sua contratilidade e suas características teciduais, diferenciando precisamente o miocárdio normal da fibrose miocárdica e identificando o edema miocárdio nas situações de agressão aguda ou recente do miocárdio, tornam a RMC indispensável hoje em qualquer serviço terciário e avançado de cardiologia do mundo. Neste artigo revisamos as aplicações clássicas e mais recentes da RMC em cardiopatias não isquêmicas, dividindo o uso das técnicas de RMC em dois grandes grupos: investigação da insuficiência cardíaca e das arritmias ventriculares. Dentro destes dois grupos pontuamos as etiologias mais importantes e frequentemente envolvidas. Na síndrome da insuficiência cardíaca destacam-se a cardiomiopatia dilatada com a fibrose mesocárdica linear septal e a miocardite viral com a manifestação de fibrose multifocal e mesoepicárdica. Uma proporção das cardiomiopatias dilatadas pode ter origem em uma miocardite viral prévia. A sarcoidose cardíaca pode apresentar uma variedade de tipos de realce tardio de padrão não isquêmico e isquêmico, e ser associada tanto ao quadro clínico de IC como de arritmia. A presença de sarcoidose pulmonar ou sistêmica pode ou não estar presente. A amiloidose cardíaca é o protótipo da cardiomiopatia restritiva e pode ser identificada pela RMC pelo padrão de realce tardio miocárdico global circunferencial (tipo AL) ou difuso, poupando o ápex do ventrículo esquerdo (tipo transtirretina). Finalmente, uma entidade ainda pouco entendida, a não compactação do ventrículo esquerdo (VE), em geral não apresenta realce tardio, mas tem fenótipo de trabeculação ventricular típico. No grupo das síndromes arrítmicas revisamos várias etiologias frequentemente associadas a esta apresentação clínica. Na hemossiderose cardíaca os valores de T2* abaixo de 20 ms indicam precisamente sobrecarga significativa de ferro miocárdico e associação com disfunção ventricular e arritmia ventricular. Na cardiomiopatia hipertrófica, a hipertrofia assimétrica e a fibrose miocárdica difusa, heterogênea e que acomete focalmente as inserções ventriculares, constituem o padrão clássico. Quantidade de fibrose acima de 15% da massa ventricular esquerda indica risco duas vezes maior de morte súbita. Na cardiomiopatia/displasia arritmogênica do ventrículo direito (VD), os volumes e a função ventricular direita global e segmentar pela RMC são partes fundamentais dos critérios diagnósticos da displasia pelo consenso atual. A cardiomiopatia chagásica tem mostrado intensa fibrose miocárdica desde as fases iniciais, mais intensa em homens que mulheres e frequentemente associada à edema miocárdico, marcador de provável inflamação crônica. A endomiocardiofibrose apresenta imagem patognomônica no realce tardio, o sinal do duplo V, caracterizando a fibrose miocárdica e trombo/calcificação preenchendo o ápex do VE e/ou VD. Nas valvopatias, além da detecção de fibrose miocárdica, que tem valor prognóstico, a RMC é precisa em quantificar as regurgitações, sendo indicada sua realização na insuficiência mitral antes da decisão de procedimento cirúrgico de troca ou correção valvar, eliminado um número significativo de casos em que a insuficiência mitral é superestimada pela ecocardiografia. Com esta revisão, cobrimos uma vasta gama de cardiopatias para as quais as técnicas de RMC realmente importam no diagnóstico e na estratificação prognóstica
Cardiovascular magnetic resonance (CMR) imaging is a noninvasive form of imaging capable of providing accurate and often unique information in the investigation of heart disease in general, and especially in cardiomyopathies. The ability to accurately characterize the myocardium in terms of its contractility and tissue characteristics, precisely differentiating normal myocardium from myocardial fibrosis and identifying myocardial edema in situations of acute or recent myocardial injury, has made CMR indispensable in any tertiary and advanced cardiology service around the World. In this paper, we review the classical and more recent applications of CMR in non-ischemic heart diseases, dividing the use of CMR techniques into two main groups: heart failure (HF) and ventricular arrhythmia investigations. Within these two groups, we highlight the most important and frequently involved etiologies. In heart failure syndrome, we focused on dilated cardiomyopathy with septal linear mesocardial fibrosis and viral myocarditis with the manifestation of multifocal and mesoepicardiac fibrosis. A proportion of dilated cardiomyopathies may have originated with an ancient viral myocarditis. Cardiac sarcoidosis may present a variety of late enhancement types of non-ischemic and ischemic patterns, and is associated with clinical signs of both HF and arrhythmia. The presence of pulmonary or systemic sarcoidosis may or may not be present. Cardiac amyloidosis is the prototype of restrictive cardiomyopathy, and can be identified in CMR by the global circumferential subendocardial (AL type) or diffuse myocardial enhancement pattern sparing the left ventricle (LV) apex (transthyretin type). Finally, a poorly understood entity, LV non-compaction generally does not present late enhancement, but has a typical ventricular trabeculation phenotype. In the group of arrhythmic syndromes, we reviewed several etiologies frequently associated with this clinical presentation. In cardiac siderosis, values of T2* below 20 ms accurately indicate a significant overload of myocardial iron and association with ventricular dysfunction and ventricular arrhythmia. In hypertrophic cardiomyopathy, asymmetric hypertrophy and diffuse myocardial fibrosis, which is heterogeneous and focally affects the ventricular insertions, constitute the classic pattern. An amount of fibrosis above 15% of the left ventricular mass indicates a two-fold increased risk of sudden death. In arrhythmogenic right ventricle (RV) cardiomyopathy/dysplasia, global and segmental right ventricular function and volumes by CMR are fundamental parts of the diagnostic criteria of dysplasia, according to current consensus. Chagasic cardiomyopathy has shown intense myocardial fibrosis since the early stages, which is more intense in men than women, and is frequently associated with myocardial edema, a marker of probable chronic inflammation. Endomyocardial fibrosis presents a pathognomonic image in late enhancement, the double V sign, characterizing myocardial fibrosis and thrombus/calcification filling the LV and/or RV apex. In valve diseases, in addition to the detection of myocardial fibrosis that has prognostic value, CMR is precise in quantifying regurgitations, and is indicated in mitral regurgitation prior to the decision for surgical valve replacement/correction, eliminating a significant number of cases in which mitral insufficiency is overestimated by the echocardiogram. This review covers a wide range of cardiopathies in which CMR techniques are extremely important in the diagnosis and prognostic stratification

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