Medicina (Ribeiräo Preto); 51 (1), 2018
Publication year: 2018
Objetivos:
Este relato descreve um distúrbio genético raro, denominado de Síndrome de Wilson,
herdado em caráter autossômico recessivo, com sintomas muito facilmente confundidos com outras doenças. A causa básica responsável pelas manifestações clínicas é o acúmulo de cobre em
diversos compartimentos do organismo humano, especialmente em locais como fígado, cérebro,
rins e córneas, devido a mutações no gene ATP7B que codifica a Cu+2 ATPase, uma proteína
transportadora de cobre que está localizada no complexo de Golgi dos hepatócitos. As alterações
hepáticas podem se apresentar como hepatite crônica, cirrose e, mais raramente, hepatite fulminante. As alterações neurológicas são variáveis, predominando os sintomas extrapiramidais, tremores, distonia, disartria, alterações de humor, sintomas psiquiátricos e, se não tratada, diminuição progressiva da capacidade intelectual. Uma das características mais extraordinárias dessa
síndrome é a grande variabilidade de manifestações fenotípicas em pacientes que possuem a
mesma mutação. No diagnóstico da doença de Wilson são analisados diversos parâmetros
bioquímicos, sendo eles: ceruloplasmina sérica, cobre sérico, excreção urinária de cobre e concentração hepática de cobre. Além disso, realiza-se exame oftalmológico com a observação de
anéis de Kayser – Fleischer. A fim de complementar e facilitar o diagnóstico podem ser realizados
estudos genéticos, visto que muitas vezes os sintomas e alterações laboratoriais podem estar
associados a outras doenças. O tratamento baseia-se no uso de drogas quelantes do cobre. A Dpenicilamina é a droga de escolha, apesar do risco de piora neurológica em até 50% dos pacientes
e dos diversos efeitos colaterais associados ao seu uso. Trientina e tetratiomolibdato são drogas
alternativas, sendo a última escolhida para indivíduos com sintomas neurológicos. O zinco tem
indicação em assintomáticos ou em terapia de manutenção. O tratamento precoce evita graves
complicações. Relato de caso:
Paciente de 14 anos de idade, natural de Poço Fundo-MG, procurou atendimento médico por apresentar episódios frequentes de paralisia facial, principalmente
na região mandibular, que levava à disfagia e disfonia, além de irritabilidade e anormalidades na
marcha. Foi submetida ao exame de ressonância magnética que mostrou “alteração de sinal
simétrica nos corpos estriados bilateralmente, com sinais de edema dos putâmens e núcleos
caudados, e atrofia dos globos pálidos. Diante do histórico familiar para a síndrome de Wilson, foi
realizado o diagnóstico diferencial, por meio da concentração de sérica de ceruloplasmina e cobre
sérico e urinário, que mostraram alterações típicas da síndrome de Wilson e a biomicroscopia
ocular que constatou a presença do anel de Kayser-Fleischer. Conclusões:
Ainda há um longo
caminho a ser seguido no que se diz respeito ao diagnóstico precoce da Síndrome de Wilson. Nesse caso, a paciente não apresentou hepatopatia pregressa. Isso mostra que a doença nem
sempre se apresenta da forma esperada, e reflete a dificuldade de estabelecer um diagnóstico
precoce que possa impedir o surgimento dos primeiros sintomas. Todos os portadores da síndrome
de Wilson necessitam de atendimento multidisciplinar, (AU)
Objectives:
This report describes a rare genetic disorder, called Wilson’s Disease, inherited in an
autosomal recessive form, with symptoms very easily confused with other diseases. The underlying cause of the clinical manifestations is the accumulation of copper in various compartments of
the human body, especially in places such as liver, brain, kidneys and corneas, due to mutations in
the ATP7B gene encoding Cu + 2 ATPase, a copper carrier protein which is located in the Golgi
complex of hepatocytes. Liver changes may present as chronic hepatitis, cirrhosis and, more
rarely, fulminant hepatitis. Neurological changes are variable, predominantly extrapyramidal symptoms, tremors, dystonia, dysarthria, mood changes, and psychiatric symptoms, if not treated,
progressive decrease in intellectual capacity. One of the most extraordinary characteristics of this
syndrome is the great variability of phenotypic manifestations in patients who have the same
mutation. In the diagnosis of Wilson’s disease, several biochemical parameters are analyzed:
serum ceruloplasmin, serum copper, urinary excretion of copper and hepatic copper concentration. In addition, an ophthalmologic examination is performed with Kayser-Fleischer rings observation. In order to complement and facilitate the diagnosis, genetic studies can be performed,
since the symptoms and laboratory abnormalities can often be associated with other diseases.
Treatment is based on the use of copper chelating drugs. D-penicillamine is the drug of choice,
despite the risk of neurological worsening in up to 50% of patients and the various side effects
associated with its use. Trientin and tetrathiomolybdate are alternative drugs, the latter being
chosen for individuals with neurological symptoms. Zinc is indicated for asymptomatic or maintenance therapy. Early treatment prevents serious complications. Case report:
A 14-year-old patient from Poço Fundo-MG sought medical attention because of frequent episodes of facial paralysis, especially in the mandibular region, leading to dysphagia and dysphonia, as well as irritability
and gait abnormalities. She underwent magnetic resonance imaging (MRI), which showed “symmetrical signal changes in the bilaterally striatum, with signs of edema of the caudate nuclei and
caudate nuclei, and atrophy of the pale globes.” In view of the family history of Wilson’s syndrome, a differential diagnosis was performed, by serum concentration of ceruloplasmin and serum and urinary copper, which showed typical changes in Wilson’s syndrome and ocular biomicroscopy, which verified the presence of the Kayser-Fleischer ring. The patient did not present previous
liver disease, showing that the disease does not always present as expected, and reflects the
difficulty in establishing an early diagnosis that may prevent the emergence of the first symptoms.
All patients with Wilson’s syndrome require multidisciplinary care since it is a disease that can
significantly affect various organs and systems (AU)