Louca América: a luta por uma América Latina sem manicômios
Mad America: the struggle for a Latin America without asylums
Publication year: 2019
Theses and dissertations in Portugués presented to the Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Medicina Social to obtain the academic title of Doutor. Leader: Silva, Martinho Braga e
A tese versa sobre a constituição e trajetória do movimento antimanicomial na América Latina. Ao longo do século XX, esse movimento social se constituiu como sujeito coletivo que encampa a denúncia da violência e repressão que o manicômio representa. Estabeleceu formas de luta pela defesa, valorização e garantia dos direitos humanos e, de maneira mais ampla, a luta pela democracia. O movimento antimanicomial latino-americano representa também a loucura em sua forma criativa e política, pois integra o conjunto de movimentos sociais que se articulam em torno da construção de espaços de liberdade, cidadania e cuidado às pessoas em sofrimento mental. O objetivo da pesquisa que originou esta tese era analisar a relação entre as reformas psiquiátricas, políticas de saúde mental e os movimentos sociais no âmbito dos países da América Latina. A pesquisa, de cunho exploratório e ativista, foi realizada através de participação e observação nos protestos, marchas, reuniões e encontros, assim como em eventos nacionais e internacionais onde estiveram reunidos líderes e representantes do movimento político. Também foram realizadas entrevistas, além de conversas, com participantes do movimento no Brasil, Argentina, Uruguai e México. Foi realizada pesquisa no acervo histórico “Memórias da Reforma Psiquiátrica”, assim como a leitura e análise de bibliografia e documentos que contribuíram para organização e reconstrução da trajetória do movimento antimanicomial latino-maericano. Como resultados, apresenta-se essa trajetória mostrando que os participantes e representantes desse movimento social conseguiram se organizar e se integrar por meio de eventos e encontros marcados pela diversidade e multiplicidade de manifestações em dois momentos históricos: pela Rede Latino-Americana de Alternativas à Psiquiatria na década de 1980; e pelos congressos internacionais de saúde mental e direitos humanos, realizados pela Universidade Popular das Madres de la Plaza de Mayo, de 2002 a 2013. Desde 2017, uma nova integração do movimento antimanicomial latino-americano vem sendo construída por meio da Rede Latino-Americana e Caribe de Direitos Humanos e Saúde Mental. Como crítica desse processo, discute-se a importância da multiplicidade e ancestralidade do movimento antimanicomial retomando seu caráter revolucionário, na medida em que integra à luta de classes. Apontam-se suas ambiguidades na forma da acomodação em torno dos processos de reforma que se faz por meio de uma visão reducionista e voluntarista da luta política. Finalmente, discutem-se seus limites mostrando como a reestruturação do Estado e das políticas públicas tem provido um deslocamento da acumulação do capital do manicômio para as drogas psiquiátricas, moldando um intenso processo de medicalização social que exige do movimento antimanicomial reflexão e estratégias de luta política. Para além desse primeiro e maior limite, o risco da fragmentação é apontado como um segundo limite a superar. A luta política em torno da loucura e seu destino social é uma dos embates sociais que se travam na América Latina constantemente e que se integra à luta internacional que se dirige à transformação e à superação do sistema capitalista. Analisar e participar do movimento antimanicomial é uma maneira de se integrar a luta por uma América Latina sem manicômios
The thesis deals with the constitution and trajectory of the anti-asylum movement in Latin America. Throughout the twentieth century, this social movement was constituted as a collective subject that provides the denunciation of the violence and repression that the asylum represents. It established forms of struggle for the defense, valorization and guarantee of human rights and, more broadly, the struggle for democracy. The Latin American anti-asylum movement also represents madness in its creative and political form, because it integrates the set of social movements that are articulated around the construction of spaces of freedom, citizenship and care for people in mental suffering. The objective of the research that originated this thesis was to analyze the relationship between psychiatric reforms, mental health policies and social movements within the countries of Latin America. The research, exploratory and activist, was carried out through participation and observation in protests, marches, meetings and meetings, as well as in national and international events where leaders and representatives of the political movement were gathered. Interviews and conversations were also held with participants from the movement in Brazil, Argentina, Uruguay and Mexico. A research was carried out in the historical collection "Memories of the Psychiatric Reform", as well as the reading and analysis of bibliography and documents that contributed to the organization and reconstruction of the trajectory of the Latin-American movement. As a result, this trajectory shows how the participants and representatives of this social movement managed to organize and integrate themselves through events and meetings marked by the diversity and multiplicity of manifestations in two historical moments: by the Latin American Network of Alternatives to Psychiatry in the 1980s; and the international congresses of mental health and human rights held by the Popular University of the Mothers of the Plaza de Mayo from 2002 to 2013. Since 2017, a new integration of the Latin American anti-manicomial movement has been built through the Latin American Network and the Caribbean on Human Rights and Mental Health. As a critique of this process, the importance of the multiplicity and ancestry of the anti-asylum movement is discussed, resuming its revolutionary character, insofar as it is part of the class struggle. They point out their ambiguities in the form of accommodation around the reform processes that is done through a reductionist and voluntarist vision of the political struggle. Finally, its limits are discussed, showing how the restructuring of the State and public policies has provided a shift from the accumulation of the capital of the asylum to psychiatric drugs, shaping an intense process of social medicalization that demands of the antimanicomial movement reflection and strategies of political struggle . Beyond this first and largest limit, the risk of fragmentation is set as a second limit to be overcome. The political struggle over madness and its social destiny is one of the social struggles that are constantly being tackled in Latin America, and which is part of the international struggle for transformation and overcoming of the capitalist system, its crises and contradictions. Analyzing, integrating and participating in the anti-asylum movement is a way to integrate into this struggle for a Latin America without asylums