Ácido acetilsalicílico e terapia combinada com dihidroartemisinina na síndrome do desconforto respiratório agudo associado à malária: análise da função pulmonar e do processo inflamatório
Publication year: 2019
Theses and dissertations in Portugués presented to the Instituto Oswaldo Cruz to obtain the academic title of Doutor. Leader: Faria Neto, Hugo Caire de Castro
A malária é uma doença parasitária predominante em países de clima tropical e subtropical, que pode levar a complicações como malária cerebral, anemia grave e síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). A SDRA é resultante da exacerbação do processo inflamatório e do sequestro de eritrócitos infectados nos capilares alveolares e pode ocorrer após o tratamento com antimalárico. Considerando que pacientes com malária também apresentam plaquetopenia, o ácido acetilsalicílico (AAS), um anti-inflamatório não-esteroidal de uso comum, que possui efeitos imunomodulatórios e antiplaquetários, poderia representar um fator de risco à população de áreas endêmicas. Desta forma, o presente estudo analisou os efeitos sistêmicos do uso da dihidroartemisinina (DHA) e do AAS na SDRA induzida por Plasmodium berghei NK65 (PbNK65). Para tal, camundongos C57BL/6 foram divididos nos grupos controle (C), inoculados com hemácias não-infectadas, e infectado (Pb), inoculados com 104 hemácias infectadas. A infecção por P. berghei NK65 levou a alterações morfo-funcionais e edema pulmonar a partir do 8º dia pósinfecção (dpi). Dentre as diferentes formas de solubilização da DHA, apenas o grupo tratado com DHA solubilizada em DMSO apresentou 100% de sobrevida. A fim de avaliar os efeitos sistêmicos da DHA e do AAS no quadro estabelecido de SDRA, o tratamento com DHA (3 mg/kg, em D8 ou por 7 dias),veículo (DMSO), AAS (100 mg/kg, dose única) ou DHA+AAS foi realizado no 8º dpi, e as análises no 9º ou 15º dpi.
A infecção por P. berghei NK65 levou ao aumento de proteínas e dos níveis de MCP-1 no fluido do lavado broncoalveolar (BALF), da elastância estática pulmonar (Est,L), das pressões resistiva (P1,L) e viscoelástica (P2,L), do infiltrado inflamatório, focos de hemorragia, edema e espessamento de septo alveolar no 9º dpi. Ademais, todos os grupos infectados apresentaram anemia, trombocitopenia, hipoalbuminemia e aumento de aspartato-aminotransferase, sem haver aumento da permeabilidade da barreira hemato-encefálica ou piora da função renal. A análise qualitativa da medula óssea indicou acúmulo de pigmento malárico e presença aumentada de megacariócitos. No fígado, notou-se aumento do número de megacariócitos, hiperplasia kupfferiana com pigmento malárico fagocitado e formação de agregados entre leucócitos e hemácias infectadas em veias centrais. O tratamento com DHA, AAS ou DHA+AAS manteve anemia e plaquetopenia observadas no grupo Pb+DMSO. A DHA reduziu Est,L, P2,L e a porcentagem de células mononucleares no pulmão em comparação ao grupo Pb+DMSO, no 9ºdpi. O AAS reduziu de forma mais discreta a celularidade total e número de células mononucleares no pulmão e reduziu os níveis de MCP-1 no BALF. Entretanto, houve aumento da Est,L e redução da sobrevida em comparação ao grupo Pb+DHA, indicando seu efeito deletério. No 15º dpi, o tratamento com DHA e DHA+AAS reduziu a leucocitose e a anemia, mas manteve plaquetopenia e alterações histológicas no pulmão, fígado e medula óssea. Conclui-se que o AAS leva à modulação do recrutamento de células mononucleares ao tecido pulmonar, mas mantem a disfunção pulmonar e a alta mortalidade na SDRA associada à malária. Assim, o uso do AAS é contra-indicado em casos suspeitos de malária. (AU)