Tocilizumabe para o tratamento de pacientes adultos com Covid-19 hospitalizados

Publication year: 2022

INTRODUÇÃO:

O tocilizumabe, um anticorpo monoclonal humanizado recombinante IgG1 dirigido contra o receptor da interleucina-6 (IL-6, citocina pró-inflamatória), pode representar uma estratégia para a redução da duração ou gravidade da infecção causada por SARS-CoV-2 em pacientes hospitalizados devido as suas propriedades imunossupressoras e potencial de controle sobre a disfunção imunitária e a inflamação.

PERGUNTA DE PESQUISA:

O uso de tocilizumabe é eficaz e seguro no tratamento de pacientes adultos com COVID-19 hospitalizados, quando comparado as opções terapêuticas recomendadas no Brasil? EVIDÊNCIAS CLÍNICAS: Para seleção das evidências clínicas foi conduzida uma revisão sistemática da literatura em busca de ensaios clínicos randomizados (ECR) e revisões sistemáticas com meta-análises (RSMA) que avaliassem os efeitos do tocilizumabe como monoterapia ou associado aos cuidados usuais - definidos aqui como ‘terapia padrão’ (corticoesteróides sistêmicos, anticoagulantes, antimicrobianos/antivirais) no tratamento de pacientes adultos com COVID-19, hospitalizados (qualquer gravidade).

As buscas eletrônicas foram realizadas nas bases de dados:

the Cochrane Library, MEDLINE via Pubmed, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e EMBASE. O risco de viés dos ECR foi avaliado pelas ferramentas Risk of Bias versão 2 da Cochrane e a qualidade metodológica das RSMA foi avaliada pela ferramenta AMSTAR-2. A confiabilidade na evidência foi graduada pelo sistema GRADE. Uma revisão narrativa adicional de estudos observacionais comparativos foi realizada para complementar a evidência encontrada. Ao todo, 58 artigos foram incluídos na presente revisão, sendo 16 deles referentes a 15 ECRs e 42 RSMA. Destas n=13 foram sintetizadas em profundidade (n=3 RSMA em rede e n=10 RSMA diretas/convencionais), uma vez que se referem a revisões mais recentes (publicadas em 2021-2022) e incluem um maior número de estudos primários. Destas, oito RSMA sintetizaram evidências exclusivamente de ECR sobre o uso de tocilizumabe em pacientes com COVID-19, sendo que parte dos autores apresentou os resultados por subgrupo populacional de acordo com a gravidade da doença. O número de ECR incluídos por RSMA variou de 6 a 12. Cinco RSMA apresentaram sínteses a partir de estudos observacionais (número de estudos incluídos variou entre 13 a 43), entretanto nenhum autor realizou análises por subgrupos da gravidade da doença. Um total de 15 ECR, conduzidos entre 2020 a 2022, comparando tocilizumabe+terapia padrão com terapia padrão foram analisados.

AVALIAÇÃO ECONÔMICA:

O resultado do caso-base evidenciou tocilizumabe + cuidado padrão com maior benefício clínico e maior custo total de tratamento em relação ao cuidado padrão: RCEI de R$24.468,79 e R$17.932,02, considerando, respectivamente, os desfechos QALY e óbitos evitados. Na análise de sensibilidade determinística, observou-se que a variável que mais impactou no modelo foi a probabilidade óbito dos pacientes hospitalizados com Covid-19 em uso de tratamento padrão. A análise de sensibilidade probabilística corrobora os resultados iniciais, mostrando que tocilizumabe + cuidado padrão apresenta um maior custo total de tratamento, porém com maior benefício clínico, em relação ao comparador para os desfechos QALY e óbitos evitados. Adicionalmente, em um cenário alternativo considerando apenas pacientes hospitalizados com COVID-19 grave, a análise de custo-efetividade de tocilizumabe + cuidado padrão demonstrou maior benefício clínico e um menor custo total de tratamento em relação ao cuidado padrão, com um valor de RCEI dominante, de - R$1.866,64 e -R$1.366,88, para QALY e óbitos evitados, respectivamente.

ANÁLISE DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO:

Os resultados do caso-base demonstram que a incorporação de tocilizumabe em pacientes adultos hospitalizados com COVID-19 num cenário de estabilização do número de casos de contaminação, leva a um impacto econômico positivo que inicia em R$ 63 milhões no primeiro ano, chegando a R$ 150,5 milhões no quinto ano de análise, gerando um total acumulado de R$ 617,8 milhões em cinco anos. Utilizando os dados do cenário alternativo 1, considerando o surgimento de uma nova variante do coronavirus, com baixa resposta vacinal, observa-se um incremento que inicia em R$ 75,6 milhões no primeiro ano, chegando a R$ 150,5 milhões no quinto ano de análise, totalizando R$ 640,9 milhões em cinco anos. Adicionalmente, um segundo cenário alternativo, considerando pacientes hospitalizados com COVID-19 grave demonstrou uma economia ao sistema que inicia em -R$ 315,5 milhões no primeiro ano, chegando a -R$ 754 milhões no quinto ano de análise, totalizando uma economia de -R$ 3,1 bilhões em cinco anos, sendo que esta economia é mantida quando esse cenário considera o surgimento de uma nova variante com baixa resposta vacinal.

MONITORAMENTO DO HORIZONTE TECNOLÓGICO:

Uma tecnologia (anakinra) foi detectada no horizonte tecnológico para compor o esquema terapêutico de pacientes adultos com COVID-19 hospitalizados em uso de ventilação não-invasiva ou cânula nasal de alto fluxo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

O tocilizumabe+terapia padrão reduziu de maneira significativa, porém marginal, as taxas de mortalidade em 28-30 dias e progressão para ventilação mecânica em 28-30 dias em pacientes hospitalizados com COVID19 comparado à terapia padrão; um benefício mais significativo no uso desta tecnologia foi encontrado para população com doença grave (sem ventilação mecânica basal) (evidência com confiança alta). Entretanto, as análises para os subgrupos de pacientes tanto com doença crítica quanto em estado moderado-grave não revelaram diferenças entre no uso de tocilizumabe+terapia padrão vs. terapia padrão para estes mesmos desfechos (evidência com confiança moderada). Não foram encontradas diferenças entre tratamentos para desfechos mensurados após 60 dias. O tocilizumabe foi bem tolerado pelos pacientes (sem diferenças vs. terapia padrão para incidência de eventos adversos gerais e sérios). A análise de custo efetividade indica que R$ 24.468,79 e R$ 17.932,02 precisam ser investidos com tocilizumabe + cuidado padrão para ganho de 1 QALY e 1 óbito evitado, respectivamente na comparação com cuidado padrão em pacientes hospitalizados com COVID-19, ou seja, os parâmetros de custo-efetividade identificados ainda que não sugiram economia com tocilizumabe + terapia padrão, sugerem um RCEI dentro de limiar de disposição a pagar, se considerado 1 PIB per capita. Por outro lado, no cenário alternativo, considerando pacientes hospitalizados com COVID19 grave, observa-se uma economia de -R$ 1.866,64 e -R$ 1.366,88 como tocilizumabe + cuidado padrão para ganho de 1 QALY e 1 óbito evitado, respectivamente. A análise de impacto orçamentário, demonstra um incremento de custo da incorporação de tocilizumabe para pacientes hospitalizados com COVID-19, gerando um total acumulado de R$ 617,8 milhões em cinco anos. No entanto, ao considerar somente pacientes hospitalizados com COVID-19 grave, observa-se uma economia de -R$ 3,1 bilhões em cinco anos, ao analisarmos um cenário de estabilização da pandemia, porém mantendo muito próximo desses valores, quando um aumento de 20% (no primeiro ano) e 10% (no segundo ano), assumidos para o surgimento de uma nova variante com baixa resposta vacinal, foi presumido.

RECOMENDAÇÃO PRELIMINAR DA CONITEC:

Os membros da Conitec presentes na 110ª Reunião Ordinária da Conitec, realizada no dia 07 de julho de 2022, deliberaram por unanimidade que a matéria fosse encaminhada à consulta pública com recomendação favorável à incorporação do tocilizumabe para o tratamento de pacientes adultos com COVID-19 hospitalizados, no SUS, conforme diretriz do Ministério da Saúde.

CONSULTA PÚBLICA:

Na consulta pública foram recebidas 55 contribuições, sendo 9 pelo formulário para contribuições técnico-científicas e 46 pelo formulário para contribuições experiência de pacientes, familiares, amigos ou cuidadores de pacientes, profissionais de saúde ou pessoas interessadas no tema. Das 9 contribuições recebidas sobre aspectos técnicocientíficos, todas expressaram “Eu acho que deve ser incorporado no SUS”. A maioria das contribuições apontou as evidências já publicadas e apresentadas neste parecer sobre a efetividade e segurança do tocilizumabe no tratamento de pacientes com SARS-COV2 ou relatos de experiências favoráveis na prática clínica. Uma das contribuições reforçou o mecanismo de ação do tocilizumabe, responsável pelos benefícios clínicos nos quadros inflamatórios como de COVID-19. A empresa fabricante da tecnologia remeteu, em destaque, aos resultados dos ensaios clínicos randomizados do uso de tocilizumabe em pacientes com COVID-19, reforçando a evidência clínica positiva do medicamento neste cenário, com redução importante nas taxas de mortalidade, ventilação mecânica e hospitalização. Estas evidências já haviam sido contempladas no parecer. Entre as contribuições técnicas, poucas se referiram a parte econômica. Apenas uma contribuição descreveu que a tecnologia em questão se trata de um medicamento de alto custo e que parte da população não teria condições de adquiri-la. No total houve 46 contribuições de experiência ou opinião. Todas as contribuições no formulário de experiência, provenientes de pacientes, interessados no tema, profissionais de saúde e familiar, amigo ou cuidador de paciente foram igualmente favoráveis à incorporação da tecnologia no SUS.

RECOMENDAÇÃO FINAL DA CONITEC:

Diante do exposto, os membros presentes do Plenário da Conitec, em sua 10ª Reunião Extraordinária, realizada no dia 17 de agosto de 2022, deliberaram, por unanimidade, recomendar a incorporação do tocilizumabe no SUS, para o tratamento de pacientes adultos com COVID-19 hospitalizados. Para essa recomendação, a Conitec considerou que a consulta pública não trouxe elementos para mudança da recomendação preliminar. Por fim, foi assinado o Registro de Deliberação nº 762/2022.

DECISÃO:

incorporar, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, o tocilizumabe para o tratamento de pacientes adultos com Covid-19 hospitalizados, conforme a Portaria nº 101, publicada no Diário Oficial da União nº 173, seção 1, página 129, em 12 de setembro de 2022.

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