Muito além do trauma: uma investigação sobre o papel das reações peritraumáticas sobre o transtorno de estresse pós-traumático
Beyond the trauma: an investigation of the role of peritraumatic reactions on posttraumatic stress disorder
Publication year: 2023
Theses and dissertations in Portugués presented to the Universidade do Estado do Rio de Janeiro to obtain the academic title of Doutor. Leader: Coutinho, Evandro da Silva Freire
O Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é uma condição debilitante que impacta significativamente a qualidade de vida dos seus portadores. Dentre vários fatores de risco para o TEPT, as reações peritraumáticas (RP), como a imobilidade tônica peritraumática (ITP), dissociação (DP) e reações físicas de pânico (RFP), estão entre as mais investigadas. No entanto, a maioria dos estudos avaliou essas RP separadamente, e o elo entre elas e o TEPT ainda não foi bem compreendido. Portanto, essa tese teve como objetivos: (i) estimar simultaneamente o efeito das três RP sobre o TEPT utilizando um instrumento validado; e (ii) avaliar se há efeito indireto da ITP sobre o TEPT mediado pelo sentimento de culpa/vergonha. Utilizamos modelagem de equações estruturais para analisar dados de 3211 participantes do Rio de Janeiro e de São Paulo. Tratamos as RP como variáveis latentes, selecionando desconfundidores específicos para cada reação. Nossas exposições foram as RP, sendo TEPT o desfecho. Calculamos odds ratios e intervalos de confiança de 95%. Utilizamos o Bayesian Information Criterion para comparar o ajuste de modelos não aninhados. Quando analisadas separadamente, todas as RP alcançaram significância estatística. No entanto, apenas DP (ORDP=1,8; IC95%:1,3-2,4) e RFP (ORRFP=2,5; IC95%:1,8-3,4) permaneceram estatisticamente significativas quando incluímos as três reações em um modelo com seus respectivos desconfundidores e correlações entre elas. Os resultados sugeriram um possível efeito da ITP sobre o TEPT (ORITP=1,4; IC95%:1,0-1,9). As interações entre as RP não foram estatisticamente significativas. Ao investigarmos o sentimento de culpa/vergonha como mediador entre ITP e TEPT, o efeito indireto alcançou apenas significância estatística limítrofe (ORITP(TNIE)=1,1; IC95%:1,0-1,2). Os efeitos direto (ORITP(PNDE)=1,3; IC95%: 0,8-1,8) e total (ORITP(TE)=1,4; IC95%:0,9-1,9) para ITP perderam significância quando todas as RP, seus desconfundidores e correlações entre elas fizeram parte do mesmo modelo. As demais RP, no entanto, permaneceram estatisticamente significativas (ORDP=1,7; IC95%:1,3-2,3 e ORRFP=2,5; IC95%:1,8-3,4). Nossos resultados mostraram que a DP e as RFP aumentaram o risco de TEPT mesmo quando consideradas em conjunto. A ITP pode ter efeito sobre o risco de TEPT, mas esse achado deve ser interpretado com cautela devido a significância limítrofe dessa RP em nosso modelo final. Também não identificamos uma mediação significativa entre ITP e TEPT pelos sentimentos de culpa/vergonha. Contudo, a significância limítrofe encontrada para o efeito indireto demanda investigações adicionais. Nossos achados reforçam a ideia de que as reações peritraumáticas devem ser analisadas e compreendidas como ocorrências simultâneas. Também seria oportuno que estudos envolvendo culpa/vergonha, ITP e TEPT focalizassem traumas caracterizados por aprisionamento e impossibilidade de escapar, dado que estas experiências são apontadas como mais susceptíveis para desencadear a ITP. (AU)
Posttraumatic stress disorder (PTSD) is a debilitating condition that greatly impacts quality of life. Among several PTSD risk factors, peritraumatic reactions (PR) such as peritraumatic tonic immobility (PTI), dissociation (PD) and physical panic reactions (PPR) are some of the most investigated. However, several studies have assessed these PR separately, and the pathway connecting them to PTSD is not well understood. Therefore, this thesis aimed to: (i) simultaneously estimate the effect of the three PR on PTSD using a validated instrument; and (ii) assess if there is an indirect effect of PTI on PTSD mediated by feelings of guilt/shame. We used structural equation modelling to analyse data from 3211 participants from Rio de Janeiro and São Paulo. We treated the PR as latent variables and selected specific confounders for each reaction. Our exposures were the PR, and PTSD was the outcome. We calculated odds ratios and 95% confidence intervals for each analysis. We also employed the Bayesian Information Criterion to compare the goodness of fit between non-nested models. Separately, all PR achieved statistically significant results. However, only PD (ORPD=1.8; 95%CI:1.3-2.4) and PPR (ORPPR=2.5; 95%CI:1.8-3.4) remained statistically significant when all three were included in a model with their respective confounders and correlations among all PR. Our findings suggested a possible effect of PTI on PTSD (ORPTI=1.4; 95%CI:1.0-1.9). Interactions between the PR were not statistically significant. When we investigated feelings of guilt/shame as the mediator between PTI and PTSD, the indirect effect achieved a borderline statistical significance (ORPTI(TNIE)=1.1; 95%CI:1.0-1.2). Direct (ORPTI(PNDE)=1.3; 95%CI:0.8-1.8) and total (ORPTI(TE)=1.4; 95%CI:0.9-1.9) effects lost their significance when all PR, their confounders and correlations were included in the same model. The other PR remained statistically significant (ORPD=1.7; 95%CI:1.3-2.3 and ORPPR=2.5; 95%CI:1.8-3.4). Our findings showed PD and PPR to increase the risk of PTSD even when considered in tandem. PTI could have an effect on PTSD, but this must be considered cautiously, as this PR only reached borderline significance in our final model. Feelings of guilt/shame did not significantly mediate PTI’s effect on PTSD. However, a borderline statistical significance in the indirect effects warrants further investigation. Our findings reinforce the hypothesis that peritraumatic reactions should be analysed and understood as simultaneous occurrences, not as separate entities. It would also be appropriate for studies concerning guilt/shame, PTI and PTSD to focus on traumas characterized by imprisonment and feelings of inescapability, given that these experiences are allegedly more likely to trigger PTI. (AU)