Sentidos de viver: o HIV, a TARV e seus desdobramentos político-afetivos entre mulheres brasileiras
Senses of living: HIV, ART and their political-affective consequences among brazilian women
Publication year: 2023
Theses and dissertations in Portugués presented to the Fundação Oswaldo Cruz. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Pós-Graduação em Saúde da Criança e da Mulher to obtain the academic title of Doutor. Leader: Maksud, Ivia Maria Jardim
A terapia antirretroviral (TARV) tem reduzido gradual e globalmente a mortalidade e a incidência das infecções oportunistas entre pessoas vivendo com HIV. Mais recentemente, a possibilidade de supressão da carga viral tem permitido que muitas pessoas vivam com uma qualidade de vida entendida por cientistas como superior às experimentadas pelas pessoas infectadas pelo vírus no início da epidemia. No entanto, o diagnóstico do HIV e a adesão à TARV implicam diferentes desdobramentos afetivos com toda sorte de reações adversas provocadas, não somente pelos medicamentos, mas, sobretudo, pelo sentido que as pessoas dão ao medicar-se e pelo estigma criado em torno do HIV/Aids. Aspectos político-afetivos podem facilitar ou dificultar a adesão a TARV e tem contornos específicos entre mulheres cisgênero e transgênero que precisam lidar com todos os desafios de sua condição feminina e suas interseccionalidades de gênero, raça e classe social. Apresenta-se aqui uma cartografia realizada com mulheres vivendo com HIV/Aids, a partir das perspectivas de Deleuze e Guattari (1995), mapeando modos de vida, processos e movimentos dos desejos e afetos. Foram realizadas entrevistas individuais com dezenove mulheres vivendo com HIV e seis encontros com dezessete mulheres distribuídas em três grupos, onde foram problematizados aspectos relacionados à tensão entre o macropolítico expresso nas políticas para o enfrentamento do HIV/Aids, suas práticas nas unidades de saúde e as micropolíticas empreendidas por cada uma delas para viverem com mais saúde. Como resultados, observou-se que é fundamental que as práticas em saúde para adesão à TARV incorporem a perspectiva da integralidade do cuidado, sobretudo, em relação aos sofrimentos psíquicos que a condição de viver com HIV cria ou agrava; e que encontros coletivos baseados na cartografia podem se tornar dispositivos de saúde capazes de estimular sinergias, acolhimento recíproco, experimentação, modos de fazer ousados e rizomáticos. Seus desdobramentos político-afetivos permitiram, aqui, travessias do lugar de captura pelo modo obliterado de assistência médico-patos-centrada para o de estabelecimento de Projetos Terapêuticos Singulares, fazendo emergir acontecimentos criativos em saúde.
Antiretroviral therapy (ART) has gradually and globally reduced mortality and the incidence of opportunistic infections among people living with HIV. More recently, the possibility of viral load suppression has allowed many people to live with a quality of life understood by scientists as superior to that experienced by people infected by the virus at the beginning of the epidemic. However, the diagnosis of HIV and adherence to ART imply different affective consequences with all sorts of adverse reactions provoked, not only by the medications, but, above all, by the meaning that people give to medication and by the stigma created around the HIV/Aids. Political-affective aspects can facilitate or hinder adherence to ART and have specific contours among cisgender and transgender women who need to deal with all the challenges of their female condition and their gender, race and social class intersectionalities. A cartography made with women living with HIV/AIDS is presented here, from the perspectives of Deleuze and Guattari (1995), mapping ways of life, processes and movements of desires and affections. Individual interviews were conducted with nineteen women living with HIV and six meetings were held with seventeen women divided into three groups, where aspects related to the tension between the macropolitics expressed in policies to fight HIV/AIDS, their practices in health units and the micropolicies undertaken by each one of them to live with more health were problematized. As a result, it was observed that it is essential that health practices for adherence to ART incorporate the perspective of integrality care, especially with regard to psychological suffering whose condition of living with HIV may create or worsen; and that group meetings based on cartography can become health devices capable of stimulating synergies, feeling of mutual belonging and respect, experimentation, bold and rhizomatic ways of doing things. Its political-affective developments, showed here, may allow crossings from the place of capture through the obliterated way of physician-centered assistance to the establishment of Singular Therapeutic Projects, giving rise to creative events in health.