Uma via periférica para os hormônios sexuais: empresariamento, biologias, classe e corpos femininos
A peripheral route for sex hormones: entrepreneurialism, biologies, class and female bodies
Publication year: 2018
Theses and dissertations in Portugués presented to the Fundação Oswaldo Cruz. Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira. Pós-Graduação em Saúde da Criança e da Mulher to obtain the academic title of Doutor. Leader: Gaudenzi, Paula
Esta tese apresenta a vida social de implantes hormonais subdérmicos produzidos e comercializados unicamente no Brasil desde a década de 1990 por uma empresa de manipulação de medicamentos denominada Elmeco.
Esses objetos farmacológicos são compostos por dois elementos fundamentais:
um tubo de silicone e uma substância química derivada dos chamados hormônios sexuais. Desde essa composição tecnológica podem ser manejados em distintas combinações através da realização de procedimento de inserção sob a pele. A ascendência destes objetos biomédicos está relacionada às políticas demográficas internacionais nas décadas de 1960 e 1970, quando um consórcio político-científico, coordenado pelo Population Council, buscava sistemas de administração de contraceptivos hormonais eficazes para controlar a fertilidade de mulheres de países periféricos na geopolítica global. Desde os primórdios da preparação deste sistema de administração de hormônios, pesquisadores brasileiros estiveram envolvidos nas pesquisas clínicas, com destacada contribuição do médico e pesquisador Elsimar Coutinho na cidade de Salvador, Bahia. Mesmo diante de vigorosas reações de pesquisadores brasileiros, durante a década de 1980, os ensaios clínicos com a primeira marca registrada de implante hormonal subdérmico no mundo, o Norplant®, foram proibidas no país e a vida desta forma farmacêutica foi provisoriamente encerrada localmente. Este episódio, entretanto, não significou o fim da vida dos implantes subdérmicos no Brasil. Desde a década de 1990, com o engajamento de Elsimar Coutinho, foi edificada uma empresa-laboratório de manipulação de medicamentos com o nome Elmeco. Assumindo a chave metodológica proposta por Geest e Whyte (1996) esta tese delineia três fases na vida social dos implantes hormonais subdérmicos produzidos pela Elmeco: a) fase de fabricação, produção e comercialização: destaca-se o processamento da cadeia produtiva operada na Elmeco, b) a fase intermediária: apresenta-se o processo de distribuição dos produtos aos seus consumidores que, no caso dos implantes, processa-se centralmente na clínica, que é, ao mesmo tempo, o espaço físico e um tipo de prática sobre o corpo hormonal; c)a fase final: analisa-se as eficácias farmacológicas destes pequenos fármacos, tomando os diferentes atores envolvidos em seu transcurso existencial: as mulheres, as farmacêuticas e os médicos. Cada estágio do ciclo de vida dos implantes possui atores, espacialidades, temporalidades e um regime de valores e normas, que são apresentadas na tese. Ainda que se procure delinear as singularidades de cada fase, um interesse comum permaneceu ao longo de toda a tese: as modificações nas relações entre corpo e objeto que se estabelecem a partir das práticas através das quais os implantes nucleiam associações e relações farmacopolíticas e, ao fazê-lo, customiza corpos sexualizados e formas de vida com distinções de classe nos cenários da biomedicina contemporânea que se enseja dentro da racionalidade neoliberal do século XXI. A eficácia farmacêutica é o último e decisivo estágio de vida, pois ela enseja o próprio sentido da existência de objetos farmacológicos. Nos contextos estudados, as relações corpo-objeto se orientam em direção à finalidade de existência deste objeto farmacológico, que são as modificações corporais possibilitadas pelos imaginários farmacêuticos dos hormônios sexuais androgênicos. Hibridizados, corpo-objeto, fazem-se um tipo de ciborgue farmacoquimico empresa cujos atributos valorizados são as atitudes enérgicas.
This thesis presents the social life of subdermal hormonal implants produced and marketed only in Brazil since the 1990s by a drug-handling company called Elmeco.