O presente trabalho teve por objeto as mortes pós aborto ocorridas nos anos de 1997 e 1998 no município de Säo Paulo, analisadas sob o enfoque do gênero.

Os objetivos que nortearam o desenvolvimento do trabalho foram:

reconstituir a assistência à saúde recebida pelas mulheres; descrever as condiçöes de vida e trabalho dessas mulheres; identificar as percepçöes de familiares das mesmas sobre o aborto e acerca das repercussöes dessas mortes no cotidiano; analisar as mortes por aborto sobre o enfoque epidemiológico e de gênero. O caminho metodológico adotado incorporou abordagens quanti-qualitativas para apreensäo da realidade, fazendo uso de técnicas de geoprocessamento em saúde, caracterizaçäo do perfil epidemiológico das mortes por aborto e entrevistas domiciliares junto aos familiares. Os resultados indicam a ocorrência de 21 óbitos de mulheres por aborto num conjunto de 260 óbitos maternos no período de 1997 e 1998. Os dados obtidos sugerem que estas mulheres eram jovens, solteiras, residentes na periferia de Säo Paulo, a maioria trabalhadora, e com 1§ grau de escolaridade. A partir das entrevistas pôde-se verificar que a trajetória que culminou com o óbito foi marcada pela falta de informaçöes, por atendimentos em serviços de saúde näo resolutivos e pequena compreensäo do processo vivenciado. Para os familiares entrevistados a morte é de difícil aceitaçäo, provocando a desagregaçäo familiar, sobretudo nos casos em que existem filhos menores. No entanto, poucos esboçam possibilidades de modificar o panorama que configura este problema, sendo que em alguns discursos está presente a culpabilizaçäo da vítima