Usos e desusos da categoria Transtornos de Conduta em adolescentes em conflito com a lei: genealogia, medicalização e práticas em saúde mental no contexto socioeducativo
Publication year: 2018
Theses and dissertations in Portugués presented to the Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Medicina Social to obtain the academic title of Mestre. Leader: Zorzanelli, Rafaela Teixeira
A literatura nacional e internacional aponta uma correlação entre adolescentes em conflito com a lei e transtornos psiquiátricos. Todavia, um tema ainda pouco explorado é a análise sociológica dessa associação, a partir da premissa de que o uso desses diagnósticos pode ser um instrumento de classificação e manejo de condições que poderiam também ser compreendidas como desdobramentos da precariedade e vulnerabilidade social desses indivíduos. Com efeito, esta população não passa indiferente aos processos de medicalização no contemporâneo e suas características, muitas vezes, são interpretadas como estados patológicos que se sobressaem à sua realidade social. O objetivo deste trabalho foi compreender as nuances sociais, epistemológicas e técnicas envolvidas no encontro dos saberes em saúde mental com esta população, mediado pela instituição socioeducativa, a fim de identificar se e como ocorreria um processo de medicalização da conduta de indivíduos internos nessas instituições. Nesse sentido, buscou-se compreender o processo de produção, transformação e usos da categoria diagnóstica Transtornos de Conduta, bem como a relação entre essa classificação psiquiátrica, marcadores sociais de diferença e forma de gestão de adolescentes em conflito com a lei em um contexto social específico. A metodologia é de cunho teórico-qualitativa e consistiu em entrevistas semidirigidas com a equipe de saúde mental de uma unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (DEGASE), bem como a análise de arquivos e documentos de adolescentes em conflito com a lei. A partir destes procedimentos, procurou-se compreender e analisar os possíveis diagnósticos psiquiátricos mais associados a este contexto institucional. Entretanto, o que se constatou é que a equipe de saúde mental não faz uso de categorias psiquiátricas, tendo em vista que o sofrimento psíquico é, na maioria das vezes, decorrente do contexto de internação ou das histórias de vida pregressas atravessadas pela violência. Sendo assim, a categoria Sofrimento Psíquico aparece como um contraponto à ideia de Transtorno Mental. O contexto social e o período de internação também emergem com maior relevância nos documentos dos adolescentes, que se tornam uma ponte entre o campo jurídico e a instituição socioeducativa. A hipótese desta investigação é de que os documentos possuem uma função dupla de controle social e, ao mesmo tempo, de denúncia. O relato dos profissionais parece os colocar em uma posição crítica frente à redução dessas vidas a uma categoria psiquiátrica. Do mesmo modo, a posição majoritária da equipe vai de encontro à literatura científica que afirma uma prevalência exorbitante de Transtornos Mentais nesta população. Estes resultados estão atrelados à metodologia empregada que possibilita apreender apenas a construção de si por parte da instituição